Hoje em dia é muito comum ouvirmos a expressão “resistência”. Culturas que “resistem”, paisagens que “resistem”, movimentos sociais que “resistem”. Voltamos – todos aqueles que tiveram a oportunidade de estar lá – na “Cazumbada 2024: Territórios Educativos Chacoalhando o Desenvolvimento”, evento promovido pelo Instituto Formação e Instituto Baixada Maranhense, do Maranhão – com a sensação de que alguns territórios simplesmente EXISTEM!Existem na plenitude de seus saberes, de suas culturas, de suas essências. Existem e se reinventam, se desenvolvem, se colaboram, e demonstram que é possível existir com ancestralidade, com tradição, com dignidade e soberania cultural. 

Ao longo de três dias, os mais de 80 convidados que estiveram presentes no evento, puderam visitar  comunidades da Baixada Maranhense, que contam com o apoio do Instituto Baixada e do Formação, através de diferentes processos formativos, desenvolvimento de projetos comunitários e apoio financeiro. Tudo dentro da lógica da filantropia comunitária.  

A primeira parada foi no quilombo Santa Rosa dos Pretos – Ilha de Cajual, onde residem cerca de 57 famílias que trabalham principalmente com o coco babaçu. Uma tradição centenária que começa pela agroecologia, com roças cultivadas em meio a uma vegetação endêmica da amazônia maranhense;  e que segue com atividades extrativistas e a produção do azeite de babaçu, feito pelas mulheres da comunidade. Com o apoio que tem recebido conseguiram implementar máquinas que ajudam a moer as castanhas do babaçu, que dá origem ao azeite, fervido e coado artesanalmente pelas moradoras. O produto atualmente é super valorizado no mercado gastronômico e também de cosméticos, e tem sido o carro chefe para o desenvolvimento local, preservando o bem viver e a tradição da comunidade. 

“Com a produção do [azeite] babaçu, muitos jovens estão retornando para a comunidade, e entendendo que podemos viver aqui com a riqueza de estar próximo de nossas famílias e cuidando do nosso território”, explica Josilene Pereira, uma das líderes comunitárias locais. 

 

No segundo dia a visita foi à comunidade de Olho D´Água dos Gomes, onde fomos recebidos ao som de uma roda de samba maranhense, com ritmo e calor comunitário. Depois do tradicional almoço com direito a juçara e farinha, fomos conhecer os processos de produção da farinha local, do mel e da juçara, produtos que têm colaborado com o desenvolvimento local e a soberania alimentar da comunidade. Hoje são cerca de 150 famílias que vivem lá e que não possuem acesso a transporte público ou saneamento básico. Suas lutas passam pela melhoria de serviços  públicos, mantendo a tradição, a cultura e o pertencimento de seu território. Na chegada, Berenice Gomes, uma das lideranças locais apresentou os processo de apoio, “estamos nos desenvolvendo cada vez mais, nos estruturando e fortalecendo a comunidade para continuar vivendo aqui com alegria e riquezas.”  

 

No município de Arari, última parada do evento, existe um trabalho de base comunitária para fortalecer o turismo da região, conhecida mundialmente pelo fenômeno da Pororoca. “Somos procurados por surfistas do mundo todo, que vem para surfar a pororoca, um evento natural de ondas gigantes em águas doces. Porém, muito pouco desse turismo volta para cidade, são na maioria agências de fora do local, que trazem tudo pronto e não envolvem a comunidade em nada. Queremos mostrar que estamos prontos para receber e sobretudo valorizar nossa comunidde”, foi o que anunciou a vereadora local Aurinete Freitas, na recepção aos convidados da Cazumbada à beira do rio Mearim. 

 

Cada comunidade por onde a Cazumbada passou, uma experiência territorial única, demonstrando diferentes formas de como o desenvolvimento local pode acontecer em organicidade com a cultura, tradição e trazendo prosperidade para todos. Comum a todos esses lugares, uma essência do existir, de simplesmente ser o que se é, autênticos, felizes,  mostrando na prática que as soluções locais EXISTEM e são potentes. 

 

*Cazumbada é uma homenagem ao personagem do folclore maranhense, o Cazumbá, um ser da floresta que não tem gênero, e que com o seu “chacoalho” na mão espalha alegria para todos os seres. 

 

Secretaria Geral do FunBEA, Semiramis Biasoli com líder comunitária Josilene Pereira, no quilombo Santa Rosa dos Pretos – Ilha de Cajual. Foto Instituto Formação. 

 

Mulheres quebradeiras de coco babaçu no Quilombo Santa Rosa dos Pretos – Ilha do Cajual. Foto Instituto Formação. 

 

Cazumbada 2024 também celebrou a força da mulher no território. Foto de Instituto Formação. 

 

Aliança Territorial da Rede Comuá se encontra no Instituto Baixada 

Aliança Territorial. Foto Instituto Formação. 

Dois dias antes de iniciar a jornada da Cazumbada 2024, as sete organizações da Rede Comuá, que constituem a Aliança Territorial, se encontraram no Instituto Formação para o seu planejamento anual. Essa aliança constituída pelo FunBEA, ICOM – Instituto comunitário da Grande Florianópolis (SC), Instituto Procomum, da Baixada Santista, Tabôa- Desenvolvimento Comunitário, de Serra Grande (Bahía), Casa Fluminense, da Baixada Fluminense do Rio de janeiro, Redes da Maré, do complexo de favelas da Maré do Rio de Janeiro e Instituto Baixada Maranhense fazem parte da Rede Comuá, de filantropia comunitária pela justiça socioambiental. A maioria dos membros das organizações participaram da Cazumbada, como um laboratório de imersão territorial, vivenciando como o financiamento para comunidades e território de fato é efetivo para o desenvolvimento do país e a transformação sustentável que o Brasil precisa fazer.